quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Faço das palavras o meu barco...


A poesia tomou conta da nossa intimidade. Pegou pra ela aquilo que, nós dois, não daríamos conta de entender. Seria bom deixar nosso amor aos cuidados dela.

Tanta delicadeza ao ler Caio Fernando Abreu  as 3h da manhã...

 

Marcou em uma hora um pouco incomum 22:40 hs da noite. Veio como um milagre alvo, cintilando o vermelho da regata, o sorriso ainda tímido e o olhar enquadrado pelos óculos da tenra idade. O ar da juventude se instalou como um canhão de luz que me apresentava um rapaz  risonho e descritivo de beleza. Uma beleza de um  rio tranquilo  sendo levado ao mar de mistérios, ainda mais profundos. Não sei explicar a alegria tomada aquela hora. Dei então um abraço e um beijo na nuca.

 

O seu jeito de homem maduro. O meu jeito de menino perdido. Os papéis da maturidade trocados no caminho do ponto até o apartamento. As palavras ainda não estavam confortáveis, apenas meus olhos. Elas não possuíam as referências todas que traçamos antes do encontro. Era uma questão de tempo. A cor vermelha era o rubor das nossas faces. Não tinha a menor ideia do que estava por vir. Estávamos jogados nos braços do inesperado diante de um largo com águas paradas. Percebi que ficava procurando os seus olhos, a toda tentativa de diálogo eu procurava o seu olhar.

Chegamos ao apartamento. Mas de quem era o apartamento? Se era meu, não tinha a menor ideia do espaço. As ordens das coisas. Não sabia que teria que oferecer água, não sabia que música colocar, não sabia se era permitido sentar tirar os chinelos. Esqueci que tinha um filme preparado aguardando o play [ Cinderela em Paris]. Também esqueci que era pra deixar as luzes apagadas, para que as velas entrassem em ação e brilho. Tudo foi tomado por um jeito de não saber fazer mais nada, daquilo que me era comum. Foi então que fiquei perdido dentro de alguns minutos nas minhas formalidades. Não havia mundo lá fora para mim. E eu gostava daquilo tudo, era puro amor e minha boca então se colocou a falar...

A cor vermelha dos livros na estante. Mexeu nos livros. Disse que era possível que tivéssemos uns 26 livros em comum. Os números não exatos,  instigantes na sua percepção. Foi nessa  hora que tentei falar sobre Adélia Prado. De um de seus poemas que eu gosto muito e que não lembrava naquele instante. Um poema que falava da não urgência dos sentimentos. Uma pena a memória falhar justo agora no curso da escrita. Foi então que me referi a outro poema dela chamado “Casamento”. Que é muito bonito também.

Ele então pegou um livro de Vinicius e sorriu para mim com a surpresa de algo que viria.  Começou a ler “Elegia ao primeiro amigo”. O vermelho entrou nas duas taças de vinhos. Tentei beber toda a taça de uma só vez para tentar liberar o que tudo aquilo provocava em mim. É que poesia, música e vinho são ingredientes maldosos para um coração.  Para o meu coração, que a tão pouco tempo foi dilacerado por uma ilusão. Não, não quero mais viver dessa fantasia.  Então as águas se soltaram e a enxurrada atravessou a sala, carregando livros, vontades e as  taças de vinho. Aconteceu o beijo.

 

O mistério do seu olhar, do seu nariz, do teu ouvido, quase não saía da tua boca. O beijo era a espuma,  o meu mar,a minha inscrição nesse teu universo particular das palavras. O vermelho estava presente na estética do filme [ Precisamos falar sobre Kevin].

 

A fantasia foi maior que tudo. O cheiro do cigarro no meu cabelo, os seus belos mamilos sendo chupado como quem chupa uma pitanga fresca. O gosto, a dor e o pudor traçados no sofá. O vermelho agora marcava nossos corpos. A fantasia continuou no quarto. Eu não usava máscaras e me despi de fantasias, estava nu diante do nosso carnaval. Nossos corpos entregues ao prazer. O caminho que percorremos  juntos ao gozo final. O seu jeito de puta de fino  trato, tanta leveza, tanta delicadeza nos modos de fuder, poderia dizer amar, mas não estou, agora, fantasiado. Toda a poesia, os encantos das lindas canções nos levaram até a minha cama. Despido de todo o conhecimento deixamos os corpos ao prazer da carne. O vermelho agora estava na ponta do meu cigarro. Fumamos pelados na janela. Cigarro de puta! Conversamos ouvindo músicas, enquanto a fumaça tomava conta do quarto. A fumaça tomou conta dos meus pensamentos. Ela acompanha minha visão,bem agora que você já se foi. Ela me faz lhe encontrar na sala, no banheiro e na minha cama. Ela me acompanha enquanto ouço aquela canção bobinha da Adele que você me apresentou. Em tudo a sua ausência se faz presente. Tantos fragmentos teus vivem dentro da minha memória.

O vermelho agora está nos meus olhos. E fique tranqüilo, não estou chorando...



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