domingo, 24 de abril de 2011

O valor do aqui e agora

Pensar no presente para melhorar o futuro. Pensar em gestos simples e que podem provocar uma transformação em vidas. A sensação era de paz dentro do ônibus que sempre pego para ir ao trabalho. Sábado de aleluia feriado + cidade completamente tranqüila + tudo dando um jeito diferente de continuar igual + tédio. Geralmente pego o ônibus executivo branco para ir ao trabalho e desta vez como tudo tava perfeito entrei em um da cor vermelha, ambos me deixam no mesmo lugar embora ache o ônibus branco mais confortável que o vermelho. Mas enfim, entrei neste ônibus vermelho e logo que ele deixou a orla peguei o livro para ler. Jamais me distraio enquanto estou a trafegar pela orla, tenho verdadeira paixão em ir reparando o mar. E assim segui viagem num ônibus completamente vazio e no colo agora o livro de Nelson Rodrigues- “Não tenho culpa que a vida seja como ela é”. Sempre que estou muito feliz, tenho receio. Receio de que esses momentos de graça prazerosos venham anunciar uma desgraça. Isso sempre...

Foram três carros atingidos em cheio, numa rua completamente vazia do tranqüilo bairro do Caminho das Árvores aqui em Salvador, a causa foi que o motorista ,do onibus executivo em que eu estava, cochilou ao volante. Um verdadeiro estrondo que ocasionou a aparição de muitos nas sacadas, janelas e portão. Foi um barulho forte e fomos arremessados pra frente. Ninguém se feriu até mesmo porque os carros estavam todos estacionados na rua.

O que não esperava e foi justamente o motivo que me trouxe até aqui para escrever refere se a reação da moça, a dona do primeiro carro que foi fortemente atingido.

No momento em que ela desceu junto com o seu namorado, do outro lado da rua parou um casal, pedindo orientação para chegar ao aeroporto. Ela tentou explicar mesmo confusa com tudo àquilo que passara diante dos teus olhos, seu carro todo amassado, as partes do ônibus na frente do prédio, a tragédia meio que sem explicação para ela- Como aconteceu tudo se ela estava estacionada e a rua é um tanto tranqüila? (ainda mais se tratando de feriado). Eu ali diante de tudo sem entender apenas olhava pra reação dela, essa coisa de ler Nelson Rodrigues e ficar ali como expectador me fascinava... Juro que me fascinava! Meu foco era a moça.

Ela tentou pedir ao namorado para dar orientação, ele não tava com cabeça, levantou os braços com a intenção de dizer: isso não é hora não vou dar porra de informação alguma! Mas quero lembrar que ele apenas levantou os braços, nada mais. Assim aquela moça ficou completamente sem ação e com certeza com um monte de “será” na cabeça. Pois ela, mesmo afoita, atravessou a rua e foi dar orientação ao casal do outro lado de como chegar ao aeroporto. Feito isso ela voltou e perguntou ao motorista do ônibus se ele estava bem e o mesmo só lamentava o ocorrido, pois ele estava atônico. O que fazer nessa hora? Eu virei a esquina ali e depois não vi mais nada...

Eu prestava bastante atenção e cheguei a conclusão de que somente a sabedoria pode emanar uma melhor qualidade de vida, que não consiste em possuir mais coisas mas descobri significados sempre mais ricos nas coisas que temos, aquela moça me deu a lição que eu precisava sobre a qualidade da vida que se vive e poder da sensibilidade feminina. Deduzo que a verdadeira diferença que nos separa dos animais não se pousa na razão ou na inteligência, mas na sensibilidade e na afetividade que somente nós humanos somos providos. Aquela moça foi muito sensivel e manteve o controle da situação. Já o seu namorado estava mais agitado pela perda do automóvel, embora acredito eu, que o seguro cubra todo o estrago.

Dali fui caminhando para o trabalho e pensei sobre a nossa pré disposição de participar da desgraça alheia. Como acompanhamos tudo de perto e indagamos a respeito com ou sem razão. Precisamos ter, continuamente, a consciência, o sentimento dessa dor. Eu sei que nenhum de nós gosta de se aborrecer. Mais importante,porém, que o nosso conforto, o nosso egoísmo, a nossa frivolidade- é o dever de participar das desgraças dos outros. Só mesmo Nelson Rodrigues para fechar esse texto.

Um comentário:

Doroni Hilgenberg disse...

Reflexivo o seu texto e nos põe em contarto com a efemeridade da vida e nosso comportamento frente as adversidades, cujo conceito varia de pessoa para pessoa. bjs