terça-feira, 9 de abril de 2013

V de Vingança



"O sentimento de  integridade é o nosso único pedacinho, mas nele somos livres"


O filme de V de Vingança (Título original: V for Vendetta) foi baseado em HQ  publicado por Alan Moore e arte de David Lloyd. Alan Moore é um autor britânico que começou escrevendo e ilustrando HQs, mas logo percebeu que seu talento se restringia a escrever roteiros de Graphic Novels. Abandonou a carreira de ilustrador e escreveu, durante os anos 80, a graphic novel “V de Vingança”, uma crítica disfarçada aos governos totalitários – que foi escrito na época que a Inglaterra vivia sob governo de Margareth Thatcher, que ficou conhecida como “Dama de Ferro”. A versão para o cinema surgiu no ano de 2006 tendo como diretor James Mcteigue, e produzido pelo os irmãos Wachowski. Existem muitas afirmações de que  o conteúdo dos quadrinhos  é bem superior ao filme, contudo, mesmo assim, o filme não perde sua genialidade se mantendo com uma das grandes genialidades do cinema mundial.
O filme se passa  numa Inglaterra futura e totalitária.  Nesse contexto que não sabemos se é real ou imaginário surge Evey , protagonizado pela brilhante atriz Natale Portman. Ao sair de casa numa determinada noite ela é surpreendida por dois rapazes e salva por um sujeito mascarado que mais tarde temos a consciência que é o próprio V ( Hugo Weaving), que é extremamente carismático e habilidoso na arte do combate e da destruição. Sabemos que existe um governo totalitário e um povo que vive sobre a pressão das verdades desse Chanceler. Também temos a impressão de que é mais um filme de ficção com um justiceiro lutando a favor da sociedade tendo questões política como pano de fundo. O filme na realidade é grandioso por apresentar muitas referências de signos e significados nos detalhes de cada cena. Com esse viés proponho a analisar a presença da semiótica e  o referencial usado pelo diretor para transmitir a mensagem.
O filme começa e termina com a destruição de algo simbólico e construído para criar um significado na sociedade que é o parlamento. Tanto no começo, quanto no final da trama a destruição é realizada ao som do prelúdio de Tchaicovsky. A destruição é feita como um espetáculo grandioso com uma trilha e fogos de artifícios. O filme apresenta logo nos primeiros minutos uma série de conceitos semióticos complexo de entender se não buscarmos  uma relação entre o signo e o referente.
Dada a complexidade da linguagem humana, seus signos e respectivas significações, Barthes, além de definir a semiótica como sendo a ciência que se ocupa do estudo de qualquer sistema de signo, considerando suas substâncias e/ou limites, também refuta Saussure, quando diz que: "A Lingüística não é uma parte, mesmo privilegiada, da ciência dos signos: a Semiologia é que é uma parte da Lingüística; mais precisamente, a parte que se encarregaria das grandes unidades significantes do discurso" (BARTHES, 1991, p. 13).
Com base nos fundamentos de Barthes podemos analisar os discursos que prevalecem no filme:
Temos um governo dominador e que se apropria de um discurso totalitário para gerar o medo na sociedade. A manipulação se torna mais latente no toque de recolher quando Evie é interceptada na rua pelos “homens dedo”. Os funcionários do estado, a captação das conversas do interior das casas, a proibição de posse de obras de arte, além de controlar o que as pessoas podiam comer, sendo que o acesso a alguns alimentos era privilégio do governo. O filme retrata um governo que detinha o poder de todos os segmentos da sociedade, inclusive dos programas de televisão que noticiavam apenas e tão somente as mentiras usadas para manipular a verdade.
A utilização da mídia para fins políticos e ideológicos, não é novidade e se constituiu não só como um eficiente disseminador de ideologias e estereótipos, mas como instrumento manipulado não só pelo Estado, mas também pelos próprios grupos terroristas. A televisão até na atualidade usa desse poder político para ditar regras.  E as palavras podem causar estragos como cita Bourdieu “ Acontece-me ter vontade de retomar cada palavra dos apresentadores que falam muitas vezes levianamente, sem ter a menor idéia da dificuldade e da gravidade do que evocam e das responsabilidades em que incorrem ao evocá-la diante de milhares de telespectadores, sem as compreender e sem compreender que não as compreendem. Por que as palavras fazem coisas, criam fantasias, medos, fobias ou, simplesmente representações falsas” (Bourdieu,1997,p.26).  No decorrer do filme temos a dramatização da notícia relatando fatos que só interessam a eles e do ponto de vista e estratégico deles para continuar a manipulação. No filme é claro a disposição de fabricar a noticia “será que as pessoas vão acreditar? Nosso dever é dar as noticias, fabricar é com o governo”, diz uma passagem do filme em que o  governo tem controle total sobre a mídia. Atenção ao detalhe estético da imagem do nariz do Chanceler, que não o agrada, resultando na demissão do diretor de fotografia.
Temos a própria mascara do V que representa algo que existe por trás daquele justiceiro. A máscara que o personagem usa, é baseada no rosto do inglês Guy Fawkes, que em 5 de novembro de 1605 tentou explodir o parlamento da Inglaterra e assassinar seus membros, junto com o rei Jaime I. A conspiração que Guy participou foi chamada de "A Conspiração da Pólvora". É muito comum hoje em dia a presença da máscara em várias manifestações  políticas mundo a fora e até mesmo no Brasil. Interessante ressaltar que por trás da máscara existe um ideal que é mais importante que a matéria viva. “Idéias não sagram”. Alguém que se esconde de algo. Usamos  uma espécie de máscara social em diferentes momentos da nossa vida social. Usamos a mascara pra qual finalidade? Para nos esconder? Se a pergunta for sim, esconder propriamente de que? Existe  algo em nós que não pode ser revelado? No filme a idéia forte da representação simbólica se faz através do uso da máscara do V de vingança.  "Um símbolo sozinho pode não representar nada, mas se todos se juntam, um símbolo pode significar muito, pode significar a mudança de um país."
Temos a estética do vermelho em todo filme, quase em todos os planos existe uma referência a cor vermelha que prevalece como marca do fascismo. O vermelho simboliza o poder, é a cor que se associa com a vitalidade e a ambição. O vermelho é uma cor emocionalmente carregada. Como é a cor mais larga do aspectro de cores visíveis ela é muito marcante e isso se traduz em suas conotações que são sempre extremas: extrema coragem, extremo amor, perigo e inferno. Essa cor predomina como marcar simbólica e extrema  no filme. Para cada morte existe uma rosa vermelha. Para cada plano sempre surge um ponto de atenção a cor vermelha.
O povo dá poder ao símbolo e sem o povo o símbolo não tem significado. No decorrer de toda a trama temos mensagens subliminares, algo que existe por trás do discurso. As canções, os filmes apresentados na trama, o parlamento, as questões humanitária e o espaço simbólico são representados o tempo todo e sabemos que somos parte desse discurso pregado em V de vingança.  “O país não precisa de um prédio e sim de esperança”. O amor, mesmo que homossexual,  é o sentimento mais bonito. Precisamos de balas de esperança e um olhar apurado para a escolha de um novo mundo. Perdemos a noção do real porque de modo inconsciente tudo se aglomera da mesma forma, como um conjunto de informações, percepções, analises, intuições. Existe uma representação de imagens, reflexos da realidade. Produzimos e consumimos bens simbólicos  e sem os signos, nada existe: nem comunicação e muito menos linguagem. Resta uma pergunta com base na idéia principal do filme: Estamos achatados no eterno presente e nossa maior preocupação tende a ser com o que pode ser consumido aqui e agora. A velocidade, e não a duração é o que vem importando. Somos indivíduos ou produtos da publicidade?


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